Entrevista: Rodrigo Lariú – Midsummer Madness

Rodrigo Lariú, figura ímpar na cena da música independente brasileira, nos concedeu uma entrevista na qual fala sobre o seu selo Midsummer Madness. Nascido em Niterói, ele fala da trajetória que levou o seu fanzine a virar um selo e o que mudou de lá pra cá.  Com 23 anos de idade e atualmente 25 títulos em distribuição pela Tratore, o selo vem desde o começo descobrindo e fomentando música alternativa de qualidade, sem se restringir a gêneros, mas sempre com uma curadoria cuidadosa. Segue a entrevista:
Como e quando começou o Midsummer Madness?
O midsummer madness começou em 1989 como um fanzine (por isso é “o” midsummer madness). A primeira edição saiu com 10 páginas em xerox nas férias de julho daquele ano. Começei a fazer o zine com 15 anos, ainda estava no colégio. Fiz porque já ouvia umas bandas que ninguém conhecia e era “o estranho da escola”. A Bia Lamego (vocalista e guitarrista das Drivellers e Stellar, hoje Enseada Espacial) tinha 14 anos e também gostava de “bandas esquisitas”. E ela me emprestou os primeiros fanzines que eu vi. Adorei aquela estória de poder fazer sua própria “revista”. Minha mãe era historiadora, envolvida com a resistência à ditadura, sempre havia estimulado a auto-produção, imprensa alternativa, etc (o que a gente conhece como DIY). Ela faleceu em 1984, bem antes de eu começar a fazer fanzine, mas quando viva, trabalhou na UFF (Universidade Federal Fluminense) com o Moacy Cirne, grande conhecedor de ficção científica e quadrinhos.Ela me apresentou a ele, e sem entender muito bem, tive mais um contato com a tal “imprensa alternativa”, afinal, a origem dos fanzines está nas revistas de ficção científica e não no movimento punk, como todos devem saber…
Fiz a primeira edição nas férias de julho de 1989, com umas pautas bem loucas. Mandei pouquíssimas cópias para alguns informativos da época e o feedback foi muito bom: o jornal O Globo falou do mm no Rio Fanzine, a revista Animal elogiou o zine no encarte MAUDITO, que era editado pelo Fábio Zimbres, etc. A partir dai, entrei no network dos fanzines brasileiros e fiquei entusiasmado.
Na 2ª edição (que na verdade era o nº1, o primeiro havia sido o nº zero), eu começei a falar de bandas brasileiras. Eu achava meio chato ficar cortando, copiando, colando e traduzindo o que saia nos semanários de música estrangeiros. Minha pilha junto com meus amigos de Niterói, onde eu morava, era da gente fazer nossas próprias matérias jornalísticas. A turminha era eu, minha irmã, a Bia, o Cadu (que já era fotógrafo na época), meu primo e alguns amigos. A gente saía juntos para entrevistar, tirar fotos e depois um diagramava a página, outro escrevia o texto e assim ia.
Você ainda faz o fanzine?
Sairam 9 ou 10 edições do midsummer madness. Os números zero e 1 em 1989 e 1990, depois o nº 4 em 1991, que foi o primeiro a sair com uma fita cassete encartada; o nº 5 também teve fita. Acho que o número 6 foi feito quando eu já estava na UFRJ e, se não me engano os nºs 7 e 8 foram feitos em gráfica, já com ajuda da Gabriela Dias (que depois foi editar o Panacea) e do Dodô (baterista da Pelvs). Parei de fazer o zine em 1994 ou 1995, quando a internet começou a aparecer por aqui.
Em 1994 eu criei a gravadora porque o lance das fitas encartadas no zine tinha dado super certo. Por causa das coletâneas do zine, eu começei a receber um nº grande de demos de bandas de todos os cantos do Brasil. Nessa época, eram poucos zines fazendo isso mas havia um mercado underground de fitas demo, vinis e CDs alternativos (como eram chamados os independentes da época) bem grande. Me lembro que durante alguns meses a Folha de SP ou o Estadão resolveu publicar um top 10 de vendas dos CDs independentes. O negócio estava borbulhando…

Histórico festival nos anos 90 dedicado a Lariú

Pra mim, lançar as fitas demos era o mesmo que lançar fanzines, só que seriam fanzines autorais, com as músicas das bandas. Eu faria toda a parte de produção, distribuição e divulgação das demos. Mas, para a imprensa da época, era uma “gravadora de fitas cassete”. O mais engraçado é que eu fiz todas estas coisas no instinto… mas depois fui descobrir que, por exemplo, a Sub Pop tinha uma trajetória parecida: começou no fanzine, lançou fitas cassete e virou gravadora.
Não faço mais o zine em papel desde 1997, se não me engano. Fiz alguma ediçoes de 4 ou 8 páginas para distribuir em festas, mas só isso.
Pode falar alguns artistas que passaram pelo seu selo? Quem faz parte do Midsummer Madness hoje em dia?
Eu sempre me perco nessa conta… acho que são 60 a 70 artistas que já passaram pelo midsummer madness. Se a gente contar os artistas das coletâneas, dai são mais de 100. Considero que todos ainda fazem parte do midsummer madness. Eu me organizo em 3 catálogos diferentes: o catálogo de EPs, que engloba as fitas cassete, os CDRs e os EPs online que lançamos até hoje; o catálogo de CDs, que começou em 1997 com Pelvs e Cigarettes e está chegando no mmcd32 com o Supercordas novo, que vai sair agora em agosto; e o terceiro e menor catálogo que é o de singles online, que são umas músicas soltas que a gente poe só no http://mmrecords.com.br
Nem todas as bandas estão disponíveis no site ainda… Nossa meta é digitalizar e disponibilizar todos os 3 catálogos na íntegra. Mas ainda falta muita coisa. O catálogo de EPs tem mais de 120 títulos, o de CDs tem 32 discos, e o de singles tem 14 títulos. São mais de 1000 músicas!
Veja essa entrevista que Lariú deu em 2009 para o blog Last Splash sobre os 20 anos do Midsummer Madness
O que você viu mudar na cena independente desde quando começou com o selo até agora?
Muita coisa… nem sei responder isso. Acho que a maior mudança foi na função de uma gravadora. No começo, meados dos anos 90, a gente era bem paternalista e centralizador. A gente pegava a banda para lançar e fazíamos tudo: prensar, registrar, distribuir, promover, marcar shows, criar festivais. De uns tempos para cá, se banda e midsummer madness não estão na mesma frequência de pensamento, só pode dar errado. Hoje a banda tem que trabalhar junto com gravadora.
E me irrita um pouco o papo de que gravadoras são desnecessárias… desde quando ter um parceiro jogando a favor é desnecessário? Quem fala que gravadoras são inúteis são as pessoas que estão pensando em gravadoras no formato old school, coisa que o midsummer madness nunca foi.
Quais os próximos planos/lançamentos do seu selo?
Acabamos de lançar o primeiro vinil em 23 anos de história, o 3º disco do Cigarettes, viabilizado por crowdfunding. São 250 cópias em tiragem de colecionador, com apoio fundamental da Locomotiva Discos, em 180g, prensado no exterior, coisa finíssima. Também lançamos um tributo ao Second Come com 29 bandas, sendo 23 em digipack e 6 online. Acabou de sair pela Multifoco, gravadora do Rio de Janeiro, o 3º disco do Luisa mandou um beijo, que teve apoio do midsummer madness. E está na fábrica neste momento o disco novo do Supercordas, intitulado “A mágica deriva dos elefantes”.
Outro plano para este ano é refazer todo o site do midsummer madness. Vamos continuar disponibilizando mp3 de graça mas vamos começar a vender fonogramas com melhor qualidade também.
O que você acha da distribuição digital de música, já que os discos do selo estão sendo disponibilizados nesse formato?
Acredito que é mais um formato. Não dá para “esconder” a música lançando em apenas um formato. Vinil, fita cassete, CD, CDR, mp3, wave de alta qualidade, todos formatos que forem possíveis são bem vindos!
Há quantos anos você está distribuindo seus títulos pela Tratore?
Se não me engano, o midsummer madness foi uma das primeiras gravadoras a entrar na Tratore, lá em 2002. Entramos de uma só vez, midsummer madness, Monstro Discos e Bizarre. Tínhamos até um logo chamado Cartel, que era para tentar conseguir alavancar as vendas conjuntas. Então, são 10 anos junto com a Tratore e indo super bem!
Veja os títulos do Midsummer Madness em distribuição pela Tratore

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